Ratatá pode ser uma onomatopéia da sinfonia urbana, tão intima de nós cariocas, produzida pelas metralhadoras espalhadas nas mãos de nossos traficantes e policiais. Ratatá, uma gíria usada pelos usuários de cocaína que indica o ato de cheirá-la, uma expressão empregada constantemente para fazer piadas entre os adeptos de tal prática. Há os que convidam seus parceiros a dar um tiro, e mais uma vez estamos falando da ingestão de cocaína. O “cano-nariz”, que projeta a droga para dentro, o cano da arma que projeta a bala para fora. A imagem do consumo da droga está intrinsecamente ligada à violência e tem por si só um tom patético. O próprio efeito da droga é violento e rápido como um tiro.
A cocaína é uma das personagens da peça, Ratatá, escrita por Daniel Tendler, e é o seu universo que dá o tom e a cor do espetáculo, dirigido por Ivan Fernandes. O ritmo é frenético, com violência e humor galopantes.
O espaço escolhido para a montagem, é uma boate GLS, muito conhecida da cena noturna e teatral do Rio de Janeiro, o Galeria, que promove após a peça uma clássica festa, que faz parte de seu “cardápio” há mais de seis anos, chamada Estrelas Mudam de Lugar, em que um ator ou atriz conhecida troca de função e se aventura como DJ ou como bartender. Portanto o ambiente em si é favorável à proliferação da droga citada e a presença de seus cultuadores.
A peça trata da história de um escritor (Alexandre Varella) que promove uma festa em seu apartamento, regada largamente a bebidas e cocaína, para um crítico (Zé Guilherme Guimarães) conceituadissimo que pode alavancar a sua carreira definitivamente. Para ascender ao patamar profissional que tanto deseja, o protagonista tem de favorecer sexualmente o seu convidado especial. Neste contexto encontramos a “fauna” que cerca o personagem principal, a atriz “sexólatra” e desconhecida, Tatiana Muniz, o drogado e alienado, “amigo dos amigos”, Alexandre Bordallo, e o traficante, Silvio Siqueira.Os personagens são caricaturas de figuras facilmente encontradas na noite e no meio artístico da urbes.
A direção é fortemente marcada pela influência do diretor de cinema Tarantino. Parece uma tentativa de um Pulp Fiction teatral. A violência levada ao seu nível mais bárbaro, entranhada na relação com a cocaína, entre os personagens e a sua própria vida e nas suas inter relações, de uma forma muito cotidiana e banalizada. E o uso da música se articulando com a cena de forma irônica.
Mas a execução do espetáculo é absolutamente superficial, pois apesar da aparência contemporânea, ficamos diante do velho teatro realista e dramático que tão bem conhecemos, com o diferencial que não temos uma exploração mais profunda dos conflitos levantados pelos personagens. Não há riscos, não há nada de novo, ou experimental. As soluções parecem ser fáceis e clichês. A sensação é que tanto o diretor como os atores, com exceção de Alexandre Varella, não estão envolvidos realmente com a peça. São imagens de fácil consumo, fazendo piada da situação caótica em que seus personagens estão inseridos. Ao espectador cabe assistir passivamente o espetáculo, pois todas as respostas estão dadas, nada há para pensar, o entendimento é servido como uma pizza. Apenas entretenimento, com questões com as quais convivemos em nosso cotidiano e que causam tantos estragos sociais. Há sim, um posicionamento político, (que eu caracterizo de cínico), mesmo que os envolvidos não tenham consciência que a todo momento se posicionem politicamente, que hoje é absolutamente comum no teatro carioca: as coisas são assim, então vamos rir delas, a gente não vai mudar nada mesmo.
segunda-feira, 4 de maio de 2009
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