domingo, 21 de junho de 2009

DIÁRIO DE UM LOUCO

SÓ FALTOU A LOUCURA

Além do tema Loucura, pauta cada vez mais evidente numa época onde a “normalidade” é discutida e questionada em vários segmentos da sociedade, a coincidência de algumas datas comemorativas está entre os principais motivos, segundo o programa da peça, para justificar a recente montagem de Diário de um Louco de Nicolai Gogol em cartaz na Sala Multiuso do SESC Copacabana. 2009 é o ano do bicentenário do próprio autor, Gogol – um dos maiores nomes da literatura eslava e considerado por muitos especialistas um dos precursores do realismo russo –, além de ser o ano de comemoração do centenário de nascimento do sergipano Arthur Bispo do Rosário, famoso paciente de um asilo psiquiátrico carioca e artista plástico consagrado nos circuitos internacionais das artes plásticas, falecido em 1989. Mas o maior dos motivos está na comemoração, também este ano, dos 40 anos de carreira do ator, diretor, autor, figurinista e cenógrafo Cláudio Tovar, protagonista desse espetáculo tem a direção de Alexandre Bordallo.

Diário de um Louco por Gogol conta a história de Auxence Ivanovitch, um homem desiludido com a sua condição de funcionário público e decepcionado com a influência que o poder tem no prestígio dos homens, e que fica perturbado e rompe com a linha que separa a loucura da razão, ao ponto de acreditar que é o rei da Espanha.

Nesta montagem, segundo o diretor Alexandre Bordallo, “a proposta não é discutir a loucura sob um enfoque patológico, e sim exaltar a genialidade artística que permeia a loucura criativa, producente, construtiva, além de celebrar os artistas condenados em suas buscas estéticas e filosóficas que muitas vezes foram ou são considerados loucos por isso”. E na peça, quase tudo contribui para atingir esse objetivo, quase tudo.

O cenário e ricos figurinos, quase todos à base de material sucateado e/ou reciclado, são do próprio Tovar e inspirados na estética das obras de Arthur Bispo do Rosário, contribuindo bem para a atmosfera da peça com a riqueza de detalhes do universo desses artistas quase sempre anônimos e considerados “loucos” por nossa sociedade. Porém, os adereços criados para representar várias personagens do conto durante a peça têm efeito apenas no início dela e logo caem no previsível depois da terceira inserção. Por serem pré-montados para uma montagem eficiente em cena, perdem sua magia nisso.

A iluminação de Aurélio de Simone é precária, muito por conta das limitações do próprio espaço, e a Trilha Sonora de Cláudio Lins cumpre bem as marcas do texto, sem maiores contribuições. Já a direção de Alexandre Bordallo tenta criar um tom intimista e confortável a toda loucura do personagem da peça, mas imprime algumas marcas mal digeridas e executadas pelo ator do espetáculo que muito comprometem a encenação, por vezes caindo num grotesco dispensável, como na cena de masturbação.

E como já dito antes, quase tudo remete à loucura neste espetáculo, faltando mesmo a loucura de Cláudio Tovar na composição do seu personagem. Com uma interpretação tensa e insegurança em vários trechos do texto, logo no início ele tenta uma cumplicidade descabida para seu personagem com a platéia. E assim vai até o final, azeitando sua composição a partir do meio em diante, mas sem atingir grandes trunfos cênicos. Ou seja, faltou apenas loucura ao Diário de um Louco.

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