sábado, 13 de junho de 2009

ROCK'N ROLL

Antes de tudo, é preciso saudar a montagem de “Rock’n Roll” de Tom Stoppard, num momento em que “espetáculos de humor em esquetes que satirizam situações do cotidiano” estreiam a cada semana, como um sopro de inteligência no atual panorama teatral carioca. Nada contra comédias em geral e “espetáculos de humor em esquetes que satirizam situações do cotidiano” em particular, somente contra a preponderância deste gênero que parece afirmar que os espectadores não querem outra coisa e não ser rir, rir, e rir, para “esquecer os problemas”. Mesmo que isso fosse verdade, os produtores e artistas teriam duas opções: se conformarem com isso e estrear um “espetáculo de humor em esquetes que satirizam situações do cotidiano” por semana ou apresentar opções de entretenimento para “esquecer os problemas” que podem ir além de algumas boas risadas. Depois dessa pequena introdução/desabafo/manifesto, passemos para o espetáculo em si.
Escrito em 2006, o texto de Tom Stoppard traça um panorama do comunismo na Europa num período que vai da Primavera de Praga (1968) até a queda do Muro de Berlim (1989), através da relação entre Max, um professor marxista da Universidade de Cambridge e Jan, um estudante tcheco. Stoppard faz a ótima opção de discutir a ideologia comunista através do indivíduo, não se comprometendo com a reconstituição da história através dos grandes acontecimentos e do movimento das massas. Estes estão presentes, sejam como citação ou como imagens projetadas em vídeo, mas o interesse do autor está nas relações pessoais e na interferência que uma ideologia política pode causar nelas. E é isto que pode interessar o público, para além das referências culturais, nomes e datas, reconhecíveis ou não.
O ótimo elenco capitaneado por Otávio Augusto (Max), Thiago Fragoso (Jan) e Gisele Fróes (em papel duplo como Eleanor, esposa de Max e em interpretação inspirada como Esme, a filha adulta do casal) é ótimo e cumpre bem suas funções, com destaque especial para o trio de atores citados acima.
A cenografia de Sérgio Marimba, com “cacos” de ambientes que remetem a pedaços do muro de Berlim, é bela como execução, mas traz grandes problemas ao espetáculo, que a direção inexperiente, apesar de bem-intencionada, de Felipe Vidal e Tato Consorti não consegue resolver. O texto propõe uma profusão de ambientes (a sala de jantar de Max, o jardim de sua casa na Inglaterra, o quarto onde Jan mora em Praga, além de ruas e a platéia de um show de rock), o que obriga a intensa troca de cenários e movimentação dos módulos criados por Marimba. A direção tenta driblar o tempo gasto nessa operação com a projeção de vídeos que situam o espectador na passagem do tempo. Mas as trocas são tão demoradas que é necessário exibi-los em loops, sempre voltando ao começo e repetindo imagens já vistas. Isso tudo impede a fluidez do espetáculo e o alonga excessivamente, interrompendo a relação entre palco e platéia de forma nefasta. A direção poderia ter encontrado outra solução para as mudanças de cena, ou até optado por uma concepção cenográfica diferente. A incapacidade ou inexperiência dos diretores em relação a essa questão acarreta graves prejuízos ao espetáculo.
É preciso destacar ainda a parte musical. Num texto que se intitula “Rock’n Roll”, a mais contestadora e transformadora forma musical está presente na excelente trilha sonora proposta pelo próprio autor e nas constantes referências à banda Plastic People of the Universe, símbolo da resistência ao comunismo tcheco e a Syd Barret, idealizador e fundador do Pink Floyd, que rompeu com a banda após o estouro de “The Piper at The Gates of Dawn”.
Jan, o estudante interpretado por Thiago Fragoso, acredita que o rock pode mudar o mundo. Tom Stoppard parece nos dizer que se o teatro não muda o mundo, pode ao menos nos ajudar a pensá-lo.

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